Conto de Natal - Terra dos sonhos - A mulher da praia

Tinha chegado a praia, por um terreno sinuoso, entre rochedos e cascalho, erguiam-se os cipreste e os pinheiros com a força de guerreiros que se mantinham lá a mais tempo que a sua existência.   

Quando desceu ficou a observar o lago que tinha a sua frente, sentiu-se em paz! Durante mais de uma hora, sentiu-se em paz, pensou na vida, pensou em si, e em tudo! 

Quando foi interrompida por uma senhora morena, cabelos pretos atados num pequeno carrapito, usava uma camisola preta curta e a parte debaixo do biquíni também preta.  Parecia estar já lá algum tempo ali na praia.
O mais engraçado para Olívia, era a praia estar totalmente deserta quando tinha chegado, e agora esta mulher estar a sua frente a falar com ela!

Olívia ouvia a falar consigo ao mesmo tempo a olhava profundamente, procurando algo mais do que uma conversa trivial. Acabou por baptiza-la de mulher de negro!


Está muito calor para esta época do ano, nos outros anos costuma ser mais suave por aqui! - afirmava a mulher.

Olívia abriu os olhos espantada por tanta vontade em fazer conexão, e acabou por responder-lhe: Sim por acaso já estava a espera de algum calor, mas é muito, deverás! E ainda nem são 12h00. 

A mulher continuava ao mesmo tempo que se sentava ao seu lado: Nestes dias assim tomam-se muitas decisões importantes, as vezes as pessoas perdem-se com o calor que faz por aqui!

Da forma como fala, parece uma perdição o calor! Ele faz bem de tempos a tempos, ao mundo inteiro! - respondeu Olívia com alguma provocação.

Sim, mas é bom para se ter queimaduras e para deixarmos boiar na água a espera de soluções! - sorriu-lhe.

Olívia ficou a olhar para ela a espera que algo acontecesse, afinal estavam a falar de decisões difíceis, e não conseguia perceber o que esta mulher queria falar com ela e sentar-se com ela a conversar. 

Como se instalou um silêncio, dando a vez do vento mostrar o seu bailado pelas árvores, ouviu-se o respirar de Olívia.  

Olhou a mulher e começou a falar com ela: É daqui?

Não, não sou! Estou aqui de passagem, vai para 10 anos. - respondeu-lhe.

Ui! Isso não é passagem, isso já é uma eternidade! O que a trouxe cá? - perguntou-lhe.

A vida, a necessidade de férias, a necessidade de parar e pensar, a necessidade de lembrar!

Olívia ficava cada vez mais equivocada, que raio de conversa sobre vidas! A sua curiosidade adensava-se, e cada vez mais ficava com vontade de saber mais, havia doçura naqueles olhos sofridos. 

Desculpe mas está a falar de uma forma, que cada vez mais fico com curiosidade sobre esta passagem - colocou as aspas com as mãos para acentuar a passagem, ao mesmo tempo que olhava para esta mulher! Ela queria dizer algo, não sabia o quê! Mas Olívia não deixava um desafio de lado, e lá ficou a espera da resposta, olhando para o lago, sentadas perto uma da outra à sombra.

E a mulher começou a falar: Vim para cá a muito tempo, vim num verão muito quente, lembro-me da viagem do autocarro, de ter falado com uma mulher que era daqui, mas que não conhecia nada disto, porque só trabalhava - casa - supermercado - trabalho - e pouco mais. 

Lembro-me de ter chegado a uma casa que tinha alugado, de ter falado com a senhoria, senhora muito simpática e muito prestável. Deixou-me ao final de alguns minutos e foi-se embora para a sua casa. 

Arrumei as coisas, e pus-me confortável em casa, era uma casa para um mês, e no final fiquei 10 anos. 

Olívia sorriu calmamente percebia que havia algo naquela história! Algo mais do que uma conversa de trivialidades! Sorriu e falou com a mulher, referindo que também a sua senhoria era simpática e prestável. Sempre disponível e preocupada, uma vez que era uma mulher que fazia férias sozinha.

A curiosidade de Olívia, crescia a cada momento, quando começou a perguntar: O que fez ficar por cá? Não parece ser de cá!

Fiquei! No dia seguinte, organizei todas as coisas e fui ao posto de turismo saber quais seriam os caminhos para fazer a pé, precisava de andar a pé ao mesmo tempo que precisava de obrigar a sair da rotina - casa-trabalho-compras para a casa e pouco mais!

Olívia sentiu-se em sintonia, era um pouco a vida dela nos últimos anos, quando respondeu a mulher: Compreendo o que sente, uma vez que se passa um pouco comigo também! Sou uma mulher que está sempre a trabalhar, uma workaholic. Não é algo que me orgulhe, apesar de adorar aquilo que faço. 

A mulher perguntou: O que faz?

Olívia respondeu: Sou gestora de empresas, estou a gerir um grupo de empresas, começou num pequeno negócio, que se transformou em 4 grandes empresas! Claro que tenho uma equipa comigo, sozinha não consegui fazer nem um décimo do que fazemos. 

A mulher sorriu e falou: Isso é bom! Eu fui médica, estive a trabalhar desde os 20 até aos meus 50 anos, a cerca de 10 anos atrás, e depois vim para cá! Foram 30 anos de dedicação e bastante esforço. Percebo-a em toda a dedicação que dá a sua profissão.

Sim afinal são 500 pessoas que dependem de mim, não me posso dar a determinados luxos de decisões de última hora, tudo têm de ser pensado e falado em equipa, para depois analisarmos todos os prós e contras! Mas no meio disto tudo acabou por formar família? Eu ainda não consegui, mas ainda sou relativamente nova, afinal tenho 32 anos, e tenho muito para viver. - reflectiu Olívia.

A mulher ficou calada, os olhos ficaram cheios de lágrimas. Ficaram mais de 10 minutos em silêncio, quando a mulher fala: Esta na minha hora! Foi um prazer conhece-la!

Olívia sorriu, mas não se sentiu a vontade de lhe dar um par de beijos na face: Com certeza que nos havemos de voltar a ver!

Claro que sim, afinal de contas ainda não lhe contei o que me fez ficar por cá! - levantou-se e foi indo para um dos trilhos que levava até lá cima.

Olívia distraiu-se com um cão que havia chegado com os donos, quando deu conta a mulher de negro havia já desaparecido no trilho.



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