Contos de Natal - Conto Primeiro - LegoMen 1ª parte

Havia chegado Dezembro, e com ele vinha sempre a nostalgia da caminhada a beira mar. 

Eram sorrisos, eram partilhas e brincadeiras, tantas e tantas! E havia sempre presente um boneco do lego. O lego havia sido sempre o que os unia, em tudo o resto não se aproximavam, nem pouco comunicavam. 

Hoje caminhava a beira mar, pelo pontão fora, em silêncio! As mãos estavam no bolso, a esquerda segurava secretamente um legomen, pequeno e amarelo. Era a sua tradição, levar um legomen por semana a passear. Todos os dias fazia a caminhada para espairecer! Partilhava com os amigos que ajudava a dormir melhor!

Somente ela sabia que nessa caminhada, num dado momento se sentava no banco, olhando o horizonte, a ouvir as ondas do mar. Olhava para os bolsos, e retirava de lá gentilmente o legomen! O desta semana era uma figura com uma vestimenta branca com um longo chapéu branco. 

Sentou suavemente nas suas pernas, em direcção ao por de sol! O sol punha-se cada vez mais cedo, mas ela nunca faltava ao por de sol, o trabalho era relativamente perto da praia e perto de casa. 

Trabalhava numa pequena empresa de contabilidade, como técnica oficial de contas, nome deverás pomposo para a sua função diária. Todos os dias organizava papeis, ordenava, agrafava e depois colocava-o no monte. Facturas e mais facturas para pagar despesas de alguém. Não as dela. 

Fazia o trabalho razoavelmente bem, apesar de não a satisfazer por perto. Seguia a empresa do pai, como seguiu os passos do pai, homem recto e muito certo nas contas. Ela por outro lado, tinha de rever todo o trabalho 2 e 3 vezes para ter a certeza de que fazia correctamente cada tarefa. 

Em alguns momentos parava, para suspirar e evitar que as lágrimas rolassem cara fora! Fazia o que era esperado desde sempre, nunca mais do que era esperado! O pai, homem recto tinha perdido a mãe para uma clínica de repouso, desde a perda da filha mais velha. A mãe vivia noutro mundo, sem a reconhecer quando ela a visitava. 

Uma vez foi vestida de borboleta, levava uma varinha mágica, e disse baixinho a mãe que a ia curar. Voou ao redor da cadeira onde a mãe se sentava a olhar o horizonte do mar. Nunca desviava o olhar, não tinha reacção, somente respirava. E naquele dia, ela voou cantando e dizendo palavras mágicas. Ela e a mãe muda, de um momento para o outro as lágrimas começaram a cair, sem dizer uma palavra a mãe olhou-a, olhos nos olhos. Ela sabia que estava a resultar, mas faltava ainda a última parte da música, quando o pai entrou pela porta dentro. Vendo a mãe a chorar, perdeu a rectidão e gritou com tamanha violência, que houve necessidade de o sedarem e o prenderem num colete de forças.
Ela nunca mais pode ir visita-la, por ordem do pai. A mãe voltou ao seu mutismo, e desde então nunca mais saiu dele. Já havia passado 25 anos, deste episódio.
Ela nunca a havia curado, nunca tinha terminado a sua missão de salvar a mãe e a família. 

Naquele momento, sentada com o legomen, lembrava-se das asas de borboleta, depois de ver uma borboleta azul a passar por ela!

Uma Phengaris Alcon, raro naquela zona, mas normal, as vezes escapavam ao velho coleccionador conde Oftenligaf, radicado na vila a muitos anos, com um pequeno paraíso construído por ele.

Olhou para o Legomen, e a vontade grandiosa de que eles pudessem ter vida, assombrou-a, falar com alguém que ajudasse a perceber a sua razão no mundo. 
Ia fazer trinta e cinco anos, e havia passado toda a vida metida num cubículo, a organizar papeis. Tirou o curso, mas nunca pode exercer, porque ajudava o pai com as empresas que ele geria, dava para os dois viverem daquilo. 
Quando havia chegado a universidade, o pai deu-lhe somente a oportunidade dela seguir contabilidade, apesar do seu sonho em seguir letras e artes. O jeito tão suave com as palavras e os pincéis, eram a harmonia suave que lhe davam vida a cada novo dia. Contudo o pai, com o seu temperamento, não assegurava nenhuma funcionária ou funcionário por lá. Já haviam passado mais de 10 mulheres e 3 homens. O máximo tempo que duravam lá eram cerca de 3 meses. Desde que a mãe se havia retirado para a clínica, que não havia ninguém que fosse suficientemente perfeito. Nem mesmo ela.

No seu trabalho continuo , o pai chamava-a de tudo, as boas vindas duraram cerca de um mês de boas relações. Desde então, tudo piorou, nunca mais foi o pai, passou a ser o patrão, que habitava com ela.
Só quando saiam para ver o por de sol, é que o pai se tornava humano. Somente na delicia de um fim de dia, e na possibilidade de amanha ser melhor davam um novo alento. Contudo terminada logo de seguida quando viravam-se em caminho ao escritório. 

Os amigos haviam-se perdido no tempo, o seu voto de solidão que fora obrigada, levou a encontrar na leitura obsessiva de livros ou construção dos legor, o escape a sua dor. Nunca mais havia pegado numa caneta para escrever um conto ou mesmo num pincel para pintar a beleza das coisas.
Naquela tarde, as coisas mudaram!

O legomen levantou-se no seu colo, virou-se em oposição do por de sol, olhou-a nos olhos e falou:

- Minha filha temos muito que conversar.

A sua expressão manifestou-se no assombro com que viveu aquele momento. Respondeu, incrédula:

- Sim, temos muito que conversar!

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